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Entrevista de Augusto Inácio à Antena 1/ Record


Andou pela Grécia, pelo Irão e por Angola mas agora voltou a Portugal para jogar a batalha da Naval 1.º de Maio. Antes de defrontar o super Benfica, o novo treinador da equipa da Figueira da Foz põe as cartas na mesa e diz que vai a jogo sem medo de levar um "xito"

Pode ouvir a entrevista em mp3 aqui ou em wma aqui

RECORD - Defrontar o Benfica após a primeira derrota desta equipa no campeonato não pode significar que a Naval vai ter pela frente uma água ferida e com sede de sangue?
AUGUSTO INÁCIO - O Benfica tem demonstrado que está diferente, que está forte e que tem grande dinâmica. Não ficou mais frágil com a derrota em Braga. Como têm dito os seus responsáveis, o Benfica está a lutar pelo título de campeão, que já lhe foge há alguns anos. Reforçou-se bem. Tem talvez o melhor plantel dos últimos 15 anos e tem feito grandes exibições, com grande dinâmica e movimentações muito interessantes. Nesta altura, o Benfica é uma excelente equipa e os seus adeptos estão com ela. Por isso, a Naval vai ter um jogo muito complicado mas este é um jogo como todos os outros e começa com 0-0. Ninguém começa um jogo a perder. Claro, teremos menos hipóteses tendo em conta o momento que o Benfica atravessa. O que não quer dizer que a Naval vai entrar em campo derrotada. Temos as nossas armas também e iremos contrariar o natural favoritismo do Benfica. Se formos à bolsa das apostas, teremos 1 ou 2 por cento de possibilidades de ganhar o jogo, o que entendo como normal. Mas nem por isso a Naval deixará de ter espaço para fazer uma gracinha. Vai ser um bom teste para nós. Também estou curioso em ver a reação dos jogadores num ambiente daqueles. Ainda estamos à procura de algumas rotinas de jogo mas nos últimos cinco jogos só perdemos duas vezes, o que nos vai permitir estar mais à vontade.

R - Muitas vezes as equipas mais pequenas assumem-se como surpresas neste tipo de jogos...

AI - É verdade. Basta ver a prestação da Académica no Dragão e o caso do Belenenses. Nestes jogos, muitas vezes os jogadores libertam-se. Tenho a consciência que a minha equipa tem jogadores que, nas situações menos boas, se desequilibram muito emocionalmente. Neste tipo de confrontos, em que está muita coisa contra nós, estou curioso para ver a resposta que eles vão dar. Estou convicto de que poderão fazer um bom jogo.

R - Mas a Luz não está um inferno?
AI - Espero que eles não se queimem! Espero que dêem uma boa resposta. Até podemos podemos perder o jogo mas também será importante uma avaliação positiva da minha equipa em relação ao seu processo evolutivo. Estes jogos também determinam muitas coisas. Individualmente, já percebemos que esta equipa da Naval não pode depender desse fator. Temos o Kerrouche, que marcou 5 dos 7 golos da equipa, mas não temos assim um craque na equipa, alguém de quem possamos dizer "este jogador pode marcar a diferença".

R - Já se sabe que a Naval vai de autocarro para Lisboa. Onde é que o vão estacionar?
AI - Nós queremos avançar. Quanto mais se defende mais perto se está de sofrer um golo. Tudo também depende daquilo que o adversário nos vai deixar fazer. Podemos não querer jogar muito atrás mas às vezes o nosso adversário empurra-nos para isso. Vamos tentar é evitar isso.

R - A regra do Benfica tem sido, esta época, alugar o seu meio-campo e jogar instalado no meio-campo do opositor...
AI - Só senti que isso não aconteceu em Guimarães e em Braga. O Benfica tem alguma dificuldade quando defronta equipas que sabem pressionar e que, acima de tudo, sabem também guardar a bola. A grande vantagem que o Benfica tem é que pressiona os seus adversários no meio-campo destes e, depois, na transição é muito rápido. Este é o grande problema que vamos ter. É que nesta altura ainda não circulamos bem a bola de forma a temporizar um pouco o jogo, que foi o que o Sp. Braga fez muito bem. Quando o Benfica defronta equipas que não controlam bem a bola, aí o Benfica é muito forte e não é uma roleta russa.

R - O que quer dizer com isso?
AI - Não é uma roleta russa, é pior, pois a roleta russa é uma bala na câmara apenas e quando estas condições se reúnem são seis balas na câmara e seis tiros - e é a morte do artista.

R - Uma goleada magoa muito?

AI - Já fui goleado em Alvalade quando estava no V. Guimarães e é claro que é algo que magoa muito. Mas também é preciso ver de que maneira somos goleados. Por muito que se explique aos jogadores a forma como Benfica pode jogar, os erros podem sempre acontecer. Esperamos é não errar muito.

R - No Benfica destaca alguém em especial?
AI - O Benfica é um bom conjunto e tem jogadores em grande forma. O Aimar nunca jogou tanto desde que chegou ao Benfica, o Saviola, que esteve dois/três anos a jogar muito pouco, parece estar sempre no sítio certo ou que a bola vai ter com ele na grande área. Depois, há um jogador que desequilibra muito na meia-esquerda: o Di María. É aquele que rompe, que provoca penáltis, que tira cartões, é um jogador que vai sempre com a bola para a frente em velocidade. Há ainda um Cardozo que está a marcar muitos golos. Não joga contra nós e podia dizer "ainda bem" mas, com Cardozo ou não, a dinâmica do Benfica vai manter-se.

R - Cá atrás é que há alguns problemas...
AI - No lado esquerdo do Benfica há algumas dificuldades. Essa posição já foi ocupada por quatro jogadores. Mas parece-me que o Javi García veio dar equilíbrio defensivo, assumindo-se também a atacar se tiver espaço. Para não falar no Ramires, que é um jogador que não tem tido baixas e que aparece muito no interior da área. Enfim, o Benfica é uma equipa sólida e não será fácil para nós.

R - E a Naval?
AI - Quando fui para a Naval perspetivei a forma como poderíamos defrontar o Benfica. Mas depois do jogo que fizemos em Leiria pensei duas vezes. Não vale a pena jogar com seis defesas porque será proporcionar um jogo de sentido único. Não queremos que o Moreira não marque um só pontapé de baliza. Se formos à Luz só para defender, não somaremos qualquer ponto e seremos goleados. Vai ser uma luta entre um gigante e uma equipa com menos possibilidades mas vamos tentar dignificar o nosso jogo, independentemente do resultado final. Temos consciência que para a Naval este campeonato vai ser uma luta titânica. O tempo diz que não há tempo. É uma equipa muito jovem, com jogadores com pouca experiência na 1.ª Liga e há algum défice de qualidade porque também temos a consciência que isto não vai lá só, como dizia um nosso amigo, com trabalho, trabalho, trabalho.

R - Vai cumprimentar Jorge Jesus?
AI - Já estava à espera dessa pergunta! Vocês nunca se lembraram de fazer essa pergunta há dez anos mas como agora vamos jogar com o Benfica... No futebol há muita hipocrisia e acho que as pessoas têm que ser aquilo que são. Se me vissem a cumprimentar o treinador do Benfica ou o treinador do Benfica a cumprimentar-me a mim, isso seria hipocrisia. Somos pessoas que temos as nossas divergências há alguns anos e não faz sentido mudar o que quer que seja só porque a Naval vai jogar com o Benfica.

R - Subscreve as palavras de Manuel Machado em relação a Jorge Jesus?

AI - O Manuel Machado tem os seus problemas e nós temos os nossos.

R - Esteve fora do futebol português durante quatro anos e quando saiu para o estrangeiro disse que a qualidade do nosso desporto-rei era fraca. Fazem falta mais equipa como o Benfica para animar o campeonato?
AI - Também é preciso ter o dinheiro do Benfica! Posso-vos dizer que temos na Naval jogadores a ganhar dois mil euros por mês. Haverá algum jogador do Benfica a ganhar isto? Nem nos juniores, certamente. Nem sempre é possível ter qualidade quando os recursos são escassos. O meu tipo de futebol é o de passe e movimento mas para isso o jogador tem de ser bom tecnicamente e o relvado também tem de ser bom. E o nosso relvado, por exemplo, está mau...

R - É a história dos ovos e das omeletas...
AI - É. Por isso, reafirmo que o nosso campeonato é competitivo mas em termos de qualidade tem as suas debilidades. O que nos obriga a uma adaptação. Por isso é que temos jogos com pouquíssimas oportunidades de golo mas este é o futebol que temos. Não mandem é tudo para cima dos treinadores. Para termos um campeonato mais competitivo, com qualidade, tem que haver menos equipas. E se conseguirmos distribuir alguns dos jogadores dos clubes grandes pelos outros clubes, sem ser na condição de empréstimo, as coisas também podem melhorar. Temos de ver que tipo de futebol queremos: com qualidade-competitivade ou competividade e menor qualidade como temos este ano?

CONTENTE COM ÊXITO DE DOMINGOS
«Até parecia que só havia um treinador para o Sp. Braga...»

R - Acredita que o Sp. Braga de Domingos pode repetir a façanha do Boavista de Pacheco?
AI - Antes de tudo, estou muito satisfeito com tudo o que o Domingos está a fazer neste início da sua carreira como treinador. Depois, porque até aqui parecia que apenas havia um treinador capaz de manter o Sp. Braga a este nível. O Domingos está a provar que não só é capaz de manter o Sp. Braga ao nível anterior mas também de o colocar num patamar superior. Outra razão por que estou contente é que eu também não gosto de ver só três grandes na luta do título. O que vemos neste momento é que está melhor o Sp. Braga nessa luta que o Sporting. Espero que o Sp. Braga possa estar ali até ao final, a lutar pelo título. Curiosamente, a equipa com menor capacidade financeira é a que está melhor, com a qualidade a sobressair também graças ao esquema que o Domingos conseguiu idealizar. Ao mesmo tempo, os jogadores estão a valorizar. O que não quer dizer que os seus jogadores sejam melhores do que os do Benfica, do FC Porto ou do Sporting (se calhar aqui alguns são mesmo melhores...). A imagem que transparece é que o Sp. Braga poderá lutar pelo título até ao fim.

R - O Sporting está fora da corrida?
AI - Agora é fácil falar. Se se lembrarem, há alguns meses disse que o Sporting era a equipa menos apetrechada, entre os grandes, para lutar pelo título e que ninguém o podia obrigar a, nestas condições, ter esse objetivo. Mas isto é falar do exterior para o interior. Obviamente, quem fala do interior para o exterior acalenta sempre esperança. O que é certo é que nesta altura o Sporting já está a grande distância e os seus adeptos desiludidos pois também lhes foi dito que o Sporting iria lutar pelo título... Não queria ter razão, queria que o Sporting estivesse na luta, mas previa isto. O Sporting contratou pouco e contratou mal.

R - Terá havido também alguma responsabilidade do Paulo Bento nesta estratégia?

AI - Depende. Um dos erros que cometi quando estive no Sporting foi aceitar algumas coisas que me foram impostas. Quando cheguei lá já estava o plantel formado. Depois chegaram jogadores em Dezembro e conseguimos subir a fasquia. Depois de sermos campeões, um dos maiores erros que cometi, face ao plantel que me ofereceram, foi não ter dito "não, com isto não continuo". Mas o coração falou mais alto. E quando me lembro do que me aconteceu, lembro-me do Paulo Bento. Mesmo assim, penso que o Paulo Bento fez um bom trabalho no Sporting. Só que as pessoas querem ver o Sporting campeão todos os anos e isso está a fugir há alguns anos.

R - E o coração como é que vê este Sporting?
AI - Não posso deixar que seja só o coração a falar. Como treinador, quero um campeonato cada vez mais competitivo. Não cabe é na cabeça de ninguém um Sporting nesta situação neste início de campeonato, não se vislumbrando caminho que possa levar o Sporting a ser de novo o Sporting que a história consagrou.

R - O FC Porto vai para o penta?
AI - Vai a caminho do penta mas com a concorrência feroz do Benfica. Uma equipa que este ano apostou nos cavalos todos, apostou tudo, tudo, tudo para ser campeão. É um monstro que estava adormecido e que está a querer acordar. Se o Benfica não for campeão, será uma grande deceção.

PRESIDENTE GREGO ANDAVA DE PISTOLA...
«Em Angola domina a força verde»

R - Neste seu périplo pelo Mediterrâneo oriental, por terras do antigo Império persa e na trepidante e africana Luanda sobrou alguma estória que mereça a pena ser contada?
AI - Bem, na Grécia aconteceram-me coisas engraçadíssimas. Por exemplo, vi um dia o nosso presidente rodeado aí por uns 200 seguranças, com duas pistolas em cada mão.

R - O que é que ele fazia?

AI - Tinha negócios num casino e exportava bebidas. Enfim, negócios da noite. O que o obrigava a ter uma boa segurança. Quando cheguei lá, a equipa tinha 9 pontos e nessa semana tiraram-lhe 3 pontos. Vim a saber que o presidente tinha dado dois socos a um árbitro. Depois, íamos contratar dez jogadores e só contratámos um. Depois, tiraram-nos mais 2 pontos porque um adepto, após terem-nos anulado um golo, saltou para dentro do campo e apertou o pescoço ao fiscal-de-linha.

R - E Angola?
AI - É um país em crescimento mas falta muita coisa.

R - Há resultados combinados?
AI - Dei lá uma entrevista em que falei numa coisa de que eles não gostaram muito. A verdade é que quando cheguei lá disseram-me que a primeira volta era dos jogadores e dos treinadores e a segunda dos dirigentes e dos árbitros. Vi situações caricatas e também por isso saí de Angola, pois o nosso trabalho é completamente anulado por fatores exteriores. A força verde tem muita importância.

R - A força verde?
AI - O dólar. Quem passou o que passei torna-se, de facto, mais condescendente com os erros dos nossos árbitros.

R - Há doping no futebol?

AI - Não me parece. Acredito que houvesse no tempo em que não havia controlo. Hoje nem sabemos quando é que eles aparecem. Por mim devia haver controlo em todos os jogos porque assim haveria não digo mais verdade desportiva mas menos suspeitas.

Fonte:RTP

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